Queria escrever um artigo sobre a timidez. Sempre fui tímido e desde os tempos escolares já perdi boas oportunidades por causa disso. Deixei de namorar uma menina, pela qual era apaixonado, só por causa da timidez e do medo de ser rejeitado por ela (hoje sei que não seria, mas a oportunidade única já passou).
Não encontro, nos tempos atuais, muitas pessoas tímidas. Os tempos mudaram ou os tímidos se esconderam mais? Talvez a internet os tenha ajudado, pois não precisam mais se expor publicamente para interagir com outras pessoas. É fácil digitar, ser aquilo que desejamos ser, copiar, colar, retocar imagens, enfatizar as qualidades e esconder os defeitos. Vejo por mim, que tenho comportamentos arrojados que muita gente, mesmo sem ser tímida, não teria. Por que será que isso acontece?
Relendo textos do Alma Carioca encontrei um, datado de 2009, mas que foi escrito em 2006 por minha amiga Cristine Martin. Faço questão de dividir com vocês, tímidos ou não. Aqui está:
Os “Pseudo-Tímidos” – Cristine Martin
Outro dia li uma crônica de Clarice Lispector sobre os tímidos, que têm vergonha de viver. Ela se classifica entre os tímidos ousados, que apesar de sua incrível timidez são capazes de gestos audaciosos, atiram-se ao desconhecido, voluntariam-se para situações inusitadas e inesperadas.
Não sou tímida. Não sou ousada. E detesto classificações, apesar de adorar a análise e observação dos seres humanos, seu comportamento, suas causas e consequências, a importância do contexto, do ambiente, das pessoas que os cercam e como tudo isso junto explode em uma salada maravilhosa que é um ser humano único e imprevisível.
Há pessoas que são realmente tímidas. Outras, apesar de não o serem, aparentam timidez. Por quê? Arrisco alguns palpites: Por exemplo, é mais fácil “ser tímido”; isso me poupa de muita situação embaraçosa (escrevo na primeira pessoa para facilitar os exemplos, não me classifiquem, por favor). Se sou “oficialmente” tímida, ninguém espera que eu cante na apresentação do colégio, nem que eu me candidate a presidente de qualquer clube, grêmio, associação ou seja lá o que for. Não esperam que eu me destaque em nada, e essa expectativa diminuída a meu respeito me livra de muita ansiedade inútil. Isso não impede que eu me arrisque; se eu tiver sucesso, será uma surpresa para todos, pois ninguém o espera. Portanto, ninguém cobra.
Outra vantagem: dos ousados espera-se grandes atitudes, grandes e fortes opiniões, enquanto que aos tímidos nem se pergunta a opinião, oh, ela vai ficar encabulada, além do que, será que ela tem alguma opinião? Isso me dá a oportunidade de manter minhas opiniões (sim, os pseudo-tímidos têm opinião!) para mim mesma; isso é muito conveniente, especialmente em assuntos espinhosos, lugares de convívio público como o ambiente de trabalho, ou as duas coisas juntas.
Quando uma pessoa “atirada” toma uma atitude de vanguarda, as pessoas pensam: “Lá vai ele de novo!” e observam, esperando o sucesso (Ele teve coragem e se deu bem) ou o fracasso (Quem mandou se meter nisso, eu sabia, não podia mesmo dar certo). Nas primeiras vezes isso choca, mas com o tempo esse tipo de atitude é esperada dessas pessoas. Lembram-se das feministas dos anos 60 e 70? Das primeiras pessoas que resolveram viver de modo diferente? Daqueles que largaram “tudo” e foram trabalhar em outra coisa, ou fazer o que queriam?
Se um pseudo-tímido tomar uma atitude de vanguarda, não se assustem: ele sabe o que está fazendo. Pensou bastante, e decidiu que é exatamente isso o que quer. Diferentemente dos tímidos, que geralmente estão agindo por impulso.
Mas uma coisa é certa: tímidos, ousados, pseudo-tímidos, de qualquer modo que sejamos, na hora de enfrentar o desconhecido é normal sentir aquele friozinho na barriga, afinal, somos humanos; no fim da estrada pode estar o sucesso ou o fracasso, mas com certeza aprenderemos com a experiência. Teremos feito nossas escolhas. E teremos vivido.
Pois duro mesmo é se arrepender de não ter escolhido.